Matéria publicada na edição 3 (fev/mar 09) da Radar Magazine, em Sydney e Gold Coast.
Existem várias maneiras de se conhecer uma cidade. Entre elas, uma das mais divertidas é percorrer os principais bairros e avenidas à pé, parando em alguns dos pubs mais emblemáticos de cada área. Em Sydney, uma epopéia dessas deve começar obrigatoriamente em The Rocks, o bairro mais antigo da cidade, e terminar em Bondi Beach, a praia mais popular e badalada da Austrália.
Apesar da distância – aproximadamente 15 km – a missão não exige muitos preparativos. Apenas uma idéia do itinerário, tênis confortáveis, amigos que não bebem leite, alguns dólares na carteira e um domingo ensolarado. Nem mesmo garrafinha d’água é necessário, uma vez que em New South Wales os pubs são obrigados a fornecer água aos clientes.
Para não queimar a maratona logo na largada, adotamos uma única regra: beber somente uma cerveja por pub. Caso contrário, não sairíamos de The Rocks.
O mais antigo
Sim! The Rocks é o lugar. É lá que estão, não só os pubs mais tradicionais e agradáveis, como a história da cidade, o início da colonização na Austrália e a polêmica mais importante desde a chegada do Captain Cook: qual é o pub mais antigo de Sydney (talvez da Austrália)?
A resposta, a princípio, é encontrada no Fortune of War, o pub em que propositalmente fizemos o primeiro brinde às 11h37 da manhã. Fortune of War e Lord Nelson brigam há mais de 100 anos pelo posto, tendo o Fortune vencido a última batalha ao provar que sua licença para vender bebida alcoólica é a mais antiga, datada de 1828. Mas se no quesito “idade” ele leva a melhor, na categoria “sentar e beber” o Lord está anos-luz à frente.
Com uma pequena linha de produção dentro do pub, eles fabricam a própria cerveja. E que cerveja! A segunda gelada do dia foi a Old Admiral, um canhão escuro com 6.1% de álcool. O lugar, construído em 1836 com pedras das redondezas, preserva a atmosfera colonial do início do século XIX, período em que The Rocks cresceu rapidamente ao lado da principal baía de acesso a Sydney, tornando-se o epicentro da boemia com tavernas, pubs, bordéis, gangues e muita confusão.
Um pouco desta época veio à tona na terceira cerveja, tomada no The Hero of Waterloo, pub que guarda muita história no subsolo. Basta uma descida para encontrar túneis por onde era contrabandeado rum, e correntes usadas para amarrar bêbados. Quanto à secular polêmica, reza a lenda que este sim é o pub mais antigo, uma vez que foi aberto em 1801 e até hoje está no mesmo lugar, só não sendo reconhecido porque nos primeiros 40 anos vendia bebida sem licença.
O escolhido pra fechar The Rocks foi o Australian Hotel, pub grande, de esquina, com mesinhas na calçada e notório pela enorme variedade de cervejas. Experimentei a Sebastian Reserve, ótima escura produzida pela Matilda Bay Brewing, empresa do oeste australiano.
Por uma questão de logística, seguimos pela George St, a rua mais antiga da Austrália. Establishment e Forbes, dois pubs que faziam parte dos planos, estavam fechados, o que ajudou a evitar os efeitos de, até então, 1845 ml de cerveja. Localizados no centro financeiro da cidade, próximos de Martin Place, eles lotam nas happy hours de segunda a sexta.
Seguindo pela George, paramos no Three Wise Monkeys, pub onde rola som ao vivo todos os dias. Como o relógio se aproximava das três, decretamos hora do almoço. Em vez do tradicional steak com mash potato, clássico dos pubs, fomos de lamb shank e beef pie. Bons, mas nada especiais. Serviram mais para manter o corpo em condições de prosseguir, e para quebrarmos a única regra do dia sapecando duas cervejas enquanto esperávamos os pratos.
Do outro lado da George St, um quarteirão a frente, fizemos a parada mais divertida: Scruffy Murphy’s, irish pub onde centenas de irlandeses se acotovelavam com seus tênis brancos para acompanhar uma decisão de boxe. Por motivos óbvio, fomos de Guiness, até então a cerveja mais barata: $ 5 a pint (copo de 570 ml). As outras, além de mais caras, eram schooner (475 ml) – exceto a Old Admiral.
Subindo
A idéia original era terminar a tour no mesmo dia e, de preferência, vivos. Para isso, decidimos otimizar o percurso seguindo para Bondi via Oxford St, eliminando pubs como Crown Hotel, em Surry Hills, e Coogee Bay e Palace Hotel, em Coogee. A essa altura o placar marcava cerca de 5.2 km percorridos, 6 pubs e 7 cervejas, num total de 3265 ml.
Do outro lado da George St, um quarteirão a frente, fizemos a parada mais divertida: Scruffy Murphy’s, irish pub onde centenas de irlandeses se acotovelavam com seus tênis brancos para acompanhar uma decisão de boxe. Por motivos óbvio, fomos de Guiness, até então a cerveja mais barata: $ 5 a pint (copo de 570 ml). As outras, além de mais caras, eram schooner (475 ml) – exceto a Old Admiral.
Subindo
A idéia original era terminar a tour no mesmo dia e, de preferência, vivos. Para isso, decidimos otimizar o percurso seguindo para Bondi via Oxford St, eliminando pubs como Crown Hotel, em Surry Hills, e Coogee Bay e Palace Hotel, em Coogee. A essa altura o placar marcava cerca de 5.2 km percorridos, 6 pubs e 7 cervejas, num total de 3265 ml.
A subida começou em Darlinghurst, bairro bastante colorido. Na verdade, um arco-íris de cores, já que é um dos principais redutos da grande população GLS de Sydney. A diversidade étnica, cultural e sexual é uma das marcas da cidade, o que nos levou ao The Colombian, um dos mais famosos. Duas coisas nos chamaram a atenção: o preço da cerveja – apenas 4.70 – a mais barata de toda a jornada; e o isqueiro temático do barman, que trazia a foto de um “princeso” nu.
Continuamos na Oxford St, agora em Paddington, uma das áreas residenciais mais antigas da Austrália. O bairro possui forte herança colonial, mas assume ares modernos e cosmopolita nas lojas de grife e restaurantes estrelados. Exemplo deste contraste está nos pubs que visitamos. O The 3 Weeds, que eu nunca ouvira falar, foi batizado pelos ex-prisioneiros ingleses e irlandeses que o frequentavam no final do século XIX. Experimentei uma cerveja à base de mel chamada Beez Neez que, por pouco, não a incorporei no meu café da manhã diário (acompanhada de iogurte e cereais deve ser uma delícia).
Já o Fringe Bar, como o próprio nome diz, está mais pra bar do que pra pub, tanto que foi o único a cobrar entrada: $ 8 com direito a uma cerveja e banda ao vivo (que tocava para os pais, irmãos e amigos bem próximos). Na travessa de cima, Glenmore Rd, fomos ao Durty Nelly's, típico pub irlandês frequentado por gente do bairro. O lugar, além de muito bacana, tem o segurança mais simpático (o que é raro).
Fechando a subida da Oxford St, paramos no Paddington Inn e no The Light Brigade, este segundo já em Woollahra. Os dois são no estilo do Fringe Bar, moderninhos e mais bar/balada do que pub. Quando deixamos o Brigade, o céu já havia escurecido e o placar apontava cerca de 10.2 km percorridos, 11 pubs e 12 cervejas, num total de 5960 ml. Agora andaríamos uns 2 km até Bondi Junction para iniciarmos a conclusão da jornada.
Saideira
O primeiro pub que tentamos entrar foi o Cock n’ Bull, ponto de encontro de irlandeses, ingleses e milhares de estudantes internacionais que vivem e estudam nos arredores. Infelizmente, fomos barrados pois uma de nossas convivas estava sem documento com foto. Seguimos então para o Tea Gardens, outro popular pub irlandês onde tomamos a última cerveja antes da descida final.
A dúvida era: Old South Road ou Bondi Road? Optamos pela segunda e encaramos mais 3 km de caminhada com a idéia de passarmos primeiro no Beach Road, pub frequentado principalmente por quem mora em Bondi (incluindo dúzias de brasileiros). Mas conforme nos aproximamos, vimos que a tradicional procissão Beach Road/Bondi Hotel já havia começado, o que significa que o pub estava fechando e restara somente um destino.
Nossa fotógrafa
Passava das 23 horas quando brindamos na parte de fora do Bondi Hotel, de frente para o mar. Das 6 pessoas que iniciaram a jornada, 3 chegaram. A fotógrafa Fernanda Cury e o casal Tércio Raddatz e Jana Rodrigues só puderam nos acompanhar até o The Colombian. À mesa, eu e os heróicos Alexandre Monteiro e Mariana Peres, mais uma vez, quebramos a única regra do dia pedindo a tradicional saideira (afinal, ninguém é de ferro). Com a sensação de dever cumprido, passamos a régua na maratona de quase 12 horas, 14 pubs, 15 km e 16 cervejas, numa bagatela total de 7235 ml. Cheers!
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